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A ESALQ e a agrointelectualidade

19/05/2025 - Por fernando de mesquita sampaio
Atenção: Os textos e artigos reproduzidos nesta seção são de responsabilidade dos autores. O conteúdo publicado não reflete, necessariamente, a opinião da ADEALQ.

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Tempos atrás recebi o honroso convite da nossa diretora Thais Vieira (para mim a querida e eterna Dra. Manek), para participar de um recém criado Conselho Consultivo da Gestão da Diretoria da ESALQ/USP.

O convite veio acompanhado de uma dupla questão a ser respondida. O que a sociedade espera da Esalq? E o que a Esalq espera da sociedade?

Em outubro passado nos reunimos, e pela primeira vez eu citei o termo agro intelectualidade, dizendo que a Esalq teria que ser um centro para se pensar o país que queremos, e como o setor agropecuário pode ajudar nessa transformação.

Isso é o que eu entendo que a sociedade brasileira espera que a Esalq seja: um vetor de transformação positiva do país. A explicação longa teria que incluir transformar o quê, para quê, e como.

Esse debate deve levar em conta a realidade do país, os cenários globais, as novas tecnologias e a inovação. Obviamente tudo isso é cada vez mais complexo de ser interpretado e demanda pesquisa e análise constante. Não há melhor lugar para fazer isso do que a universidade.

Mas para mim, o como passa também pela formação de lideranças.

Há algumas semanas o site O Joio e o Trigo publicou uma reportagem de Julia Dolce que nos convidava a conhecer a Esalq, a escola que forma quem defende o Agro. Pela reportagem, que repercutiu em vários grupos de Esalqueanos por aí. Pela leitura (onde eu inclusive sou citado), a Esalq é um madraçal a serviço da indústria química e de latifundiários. Não acredito que isso corresponda à verdade, primeiro porque temos esalqueanos de destaque atuando em governos, sociedade civil, empresas, pesquisas e é claro, na produção, da agroecologia à agricultura de precisão ultra tecnológica. A ciência que a Esalq produz ajudou a reduzir significativamente os impactos da agropecuária. E cada vez mais muda o perfil de quem ingressa na Esalq, em renda e diversidade, o que precisa ser visto como um avanço mais do que necessário.

O desafio verdadeiro está em manter a Escola conectada às transformações do mundo, e criar lideranças capazes de influenciar positivamente o setor pensando não apenas em benefício próprio, mas no país.

Como universidade pública, a Esalq tem a obrigação dobrada de prestar contas à sociedade, inclusive do tipo de lideranças que cria.  E há uma diferença aí entre o financiamento privado da universidade, e usar a universidade para uma agenda de interesse exclusivamente privado.

PS1. Este texto foi só uma introdução para o artigo que vai abaixo, publicado hoje no Agfeednews

https://agfeed.com.br/campo-das-ideias/producao-sustentavel/a-urgencia-de-o-brasil-reunir-sua-agrointelectualidade/

PS2. Eu sempre cito o GPP, Grupo de Políticas Públicas da Esalq como um exemplo do tipo de debate que a Escola precisa promover com a sociedade.

PS3. Já fui um azulão agroboy. Mas se há uma coisa que a Esalq e a vida me ensinaram é estar aberto a argumentos. Mudei de opinião várias vezes na vida em temas diversos. Só um idiota é incapaz de mudar de opinião mediante novas evidências. Na ciência vale o lema da Royal Society, Nullius Verba. Ninguém tem a última palavra.

 

Da AgFeed


A urgência do Brasil reunir sua agrointelectualidade

O dia 8 de maio de 2025 marcou o 80º aniversário do fim da Segunda Guerra Mundial, um conflito que causou 60 milhões de mortes em todo o mundo.

Passou quase desapercebida no Brasil uma declaração feita por 48 grandes empresas alemãs, incluindo Bayer, Basf, Volkswagen, Deutsch Bank, Siemens e Adidas para citar algumas.

A declaração diz que a tomada de poder pelos nazistas em 1933 não teria sido possível sem a falha das lideranças públicas e do setor privado à época. Essas lideranças tornaram-se cúmplices pela conivência, ao priorizar seus próprios interesses.

Diz ainda: “Hoje, nós, como empresas alemãs, assumimos a responsabilidade de manter viva a memória dos crimes cometidos durante o período nazista. Esses crimes nos alertam continuamente sobre a fragilidade da democracia. Juntos, nos posicionamos contra o ódio, contra a exclusão e contra o antissemitismo. Com a nossa geração, não haverá esquecimento.”

A Alemanha aprendeu isso da pior maneira possível. O nazismo ter acontecido é uma vergonha para todos os alemães daquela época.

Mas a atitude desses empresários hoje pode ser uma lembrança poderosa do papel que lideranças do setor privado podem, devem e precisam ter em momentos de crise.

Penso no Brasil, e nas lideranças que temos no setor agropecuário, o setor que move a economia do país. Somos extremamente competentes, e a prova disso é a evolução constante da nossa produção e nossa presença nos mercados internacionais.

Mas precisamos ser competentes não apenas em relação só ao negócio em si, mas em pensar o país além do agro, no tipo de sociedade que queremos e no papel que o Brasil tem no mundo no longo prazo, especialmente em um mundo tão complexo e incerto como o que vivemos.

O tipo de liderança que precisamos é da mesma estirpe dos que há 50 anos atrás decidiram que o país precisava se tornar um grande produtor de alimentos.

Eu destacaria aqui alguns macro temas onde seria preciso que o setor pensasse o que quer para o país e como chegar lá.

A crise climática e de biodiversidade e a relação com o uso da terra no país.

A desigualdade social brasileira.

A estrutura política e a institucionalidade.

O papel do Brasil no cenário geopolítico mundial (que para mim está intrinsecamente ligado ao primeiro tema).

Olho nossas lideranças. Nas entidades, todas em maior ou menor grau politizadas. Nas empresas, sempre tentando sobreviver no curto prazo. E entre produtores, fragmentada, reativa e cacofônica, muitas vezes sem informação suficiente para entender o que está acontecendo. E com mulheres e jovens (vetores de mudanças), na maior parte das vezes em segundo plano.

A título de exemplo, vejo como única preocupação de algumas lideranças do agro em relação à COP é “não deixar que falem mal de nós”.

Ainda estamos dando poder a lideranças políticas incapazes por interesses de curto prazo. Ainda reagimos mais do que agimos em relação aos desafios globais

Acredito na urgência de uma agrointelectualidade. De reunir uma rede de inteligência capaz de pensar macro temas como esses e direcionar lideranças públicas e privadas para um futuro possível.

Essa inteligência existe, ainda que esteja fora das empresas e entidades e  concentrada em alguns núcleos como o Insper, Getúlio Vargas, Dom Cabral, Esalq, centros de pesquisa e think tanks como Agroicone, Cebri, Cebrap e outros.

Seria poderoso e transformador um diálogo permanente entre estas instituições para desenhar um futuro onde o setor tenha um papel cada vez mais positivo em relação à natureza e à sociedade, não na forma de planos a serem engavetados, mas na criação de lideranças capazes.

Cabe assim reflexão sobre nosso setor privado, e a lição alemã. Omitir-se agora em nome de interesses imediatos pode ter consequências desastrosas.

Parafraseando Tolstói o passado não pode ser mudado. O futuro ainda não aconteceu. “"O momento presente é o único tempo sobre o qual temos domínio."

É hoje que devemos agir.

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